A forma como está sendo conduzido o novo acordo de reparação pelos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em 5 de novembro de 2015, tem gerado fortes críticas por parte da Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (AMIG). Para a entidade, a baixa adesão dos municípios ao termo firmado no Supremo Tribunal Federal (STF) reflete a insatisfação dos afetados e a consolidação do protagonismo municipal na defesa de seus direitos.
Recentemente, 21 municípios decidiram litigar contra as mineradoras Samarco, Vale e BHP, buscando indenizações maiores do que as previstas no acordo nacional, que prevê R$ 170 bilhões. O principal ponto de contestação é a distribuição dos valores, considerada desigual. Para as prefeituras, que receberiam apenas R$ 6,1 bilhões ao longo de 20 anos, o valor mínimo deveria ser de R$ 17,5 bilhões.
O prefeito de Mariana, Juliano Duarte, destacou que, apesar de considerar o montante global do acordo justo, a divisão prejudica diretamente os municípios atingidos. Por isso, cidades como Mariana estão apostando em processos internacionais, como a ação movida na Justiça britânica, que reivindica R$ 52 bilhões da BHP. O município de Mariana, especificamente, pleiteia R$ 28 bilhões, a serem pagos de uma única vez, contra os R$ 1,2 bilhão previstos no acordo nacional, diluídos em 20 anos.
“A economia de Mariana, junto com a barragem, desmoronou. O município perdeu quase 70% da sua receita e muitos investimentos, obras e programas que estavam em andamento tiveram de ser paralisados. Não foi a empresa Samarco que parou as atividades. Foi a mineração inteira durante anos. E isso gerou um caos social em Mariana. Muito desemprego”, afirmou o prefeito.
Questionado sobre a decisão do ministro Flávio Dino, que impediu que qualquer valor indenizatório – no Brasil ou no exterior – seja usado para pagar escritórios estrangeiros, Duarte disse que a liminar deixa claro que os municípios têm autonomia para ingressar com ações. “Estamos abertos ao diálogo, mas, nesses termos do acordo, não iremos aceitar”, pontuou Duarte.
Segundo o prefeito de Mariana, boa parte dos municípios que aderiram ao acordo o fizeram por dificuldades financeiras graves. Ele citou o caso de Barra Longa (MG), onde o prefeito alegou precisar do dinheiro para pagar os servidores.
Municípios deixados de lado – Um dos pontos mais criticados pela AMIG, desde o início das conversas para criação do acordo de Mariana, é a forma como o texto foi elaborado. Segundo Waldir Salvador, consultor de relações institucionais e econômicas da associação, os municípios não foram chamados para discutir os termos antes da assinatura. “Essa imposição de cima para baixo, como dito pelo prefeito de Mariana, foi a maior razão para a rejeição do acordo”, afirmou.
Para Salvador, o desfecho desse impasse demonstra a fragilidade do modelo de governança da mineração no Brasil.”O setor privado não pode ditar as regras sozinho, e o Governo Federal não pode continuar aceitando tudo o que é imposto pelas mineradoras. Os municípios não aceitarão mais que isso aconteça”, enfatizou.
Para o Prefeito de Ouro Preto, Angelo Oswaldo, o acordo é extremamente prejudicial aos municípios atingidos. “Ouro Preto, como município impactado e sede da Samarco, não foi contemplado devidamente, e tudo isso me parece um grande absurdo. Perdemos nove anos nas mãos da Fundação Renova, uma das maiores armadilhas já montadas no Brasil para lesar o interesse público, e não temos nenhuma resposta efetiva, consequente e produtiva para a atualidade e o futuro dos nossos municípios”, avalia.
Ele ressalta que o município continua prejudicado com grandes danos que não foram ressarcidos e reforça a importância de que haja uma revisão disso. “Por isso, o município de Ouro Preto entrou com um mandado de segurança contra esse acordo. Nem sequer fomos convidados para a reunião com o presidente Lula, no Planalto, em Brasília. A caracterização de Ouro Preto como município atingido ainda não está definida, apesar de decisões reiteradas da décima segunda vara da Justiça Federal em Belo Horizonte”, defende o prefeito.
Para a AMIG, a rejeição do acordo por parte dos municípios atingidos demonstra uma mudança de postura: “eles não aceitam mais impactos sem a devida reparação, nem decisões impostas sem diálogo com todos os atores envolvidos”. A entidade defende que a tributação da mineração, como o Imposto Seletivo criado pela Reforma Tributária, seja direcionada diretamente a estes territórios afetados, garantindo maior autonomia e protagonismo local. “Os municípios não vão mais aceitar uma mineração mal feita, mal legislada, mal fiscalizada e mal regulada pelo governo federal, cujos reflexos negativos recaem sobre os territórios. O que está acontecendo em Mariana é a maior prova do que a AMIG alerta há anos: a mineração precisa acontecer de baixo para cima, com diálogo e respeito às comunidades atingidas”, reforça a associação.